Minha História - Capítulo 3: Entrando no universo do planejamento (onde nada saiu como o planejado)
Fazia alguns meses que algo extraordinário tinha acontecido na minha vida. Após morar em uma cidadezinha do interior e trabalhar limpando cocô de galinha, criei um blog que estava se tornando cada vez mais conhecido e havia conseguido um emprego em uma agência de publicidade em São Paulo para trabalhar com grandes marcas. E isso aos 17 anos de idade. Tudo estava indo muito bem, porém duas coisas mudariam o rumo das coisas, tornando a jornada ainda mais emocionante.
A primeira coisa é que os 18 anos estavam chegando e era hora de entrar na faculdade. Em 2007 eu havia feito o ENEM para tentar uma bolsa de estudos em uma universidade particular. O curso desejável obviamente era publicidade e propaganda. Lembro que fiz o ENEM e tirei uma nota razoável (o que poderia ser representado como um 7 talvez), porém eu acreditava que essa nota seria o suficiente para conseguir uma bolsa de 50%, 70% ou Integral em pelo menos uma das 5 opções que eu tinha em mente. Essa crença veio com base em parentes que haviam falado de conhecidos que tiraram por volta de 6 e conseguiram entrar com bolsa integral em faculdades particulares boas no curso de TI. Também tinha o fato de que publicidade não era um curso tão concorrido como medicina, engenharia ou direito. Quando a data de inscrição para o PROUNI chegou eu fui com tudo no site e já listei o minhas 5 opções sem pensar: ESPM, FAAP, Mackenzie, Anhembi Morumbi, PUC. Detalhe: Selecionei bolsa integral em todas.
- CORTA -
Navegando na internet e explorando o universo da publicidade me deparo com um desafio da JWT, uma das maiores agências e referência da época, para um estágio de planejamento. Aquilo me chamou a atenção pois meu irmão tinha acabado de migrar para a área de planejamento e tinha me contado com empolgação sobre como era o trabalho. Com a auto-confiança lá em cima devido ao sucesso que tive ao realizar um desafio de negócios para entrar na Riot, pensei: vou participar!
Lembro que o briefing do desafio era montar um planejamento de marca completo para uma escola de informática. Coisas como números de mercado, análise de concorrência, problema, insight, solução e plano de comunicação eram o requerido. Fiz minha parte e durante o tempo proposto montei meu business case e mandei para a agência. Para a minha surpresa, meu trabalho foi selecionado para a próxima fase de entrevistas na agência. Foi a primeira vez que havia visitado uma agência grande. Fiquei encantado com a infraestrutura, o número de funcionários e os prêmios que estavam à mostra nas prateleiras. Ali a entrevista era uma pegada mais séria e precisei me desdobrar para mostrar que eu tinha potencial e capacidade para o cargo. Saí da entrevista sem realmente saber se seria aceito ou não, mas a experiência já havia sido super valiosa. Alguns dias depois recebo uma ligação do diretor de planejamento da RMG Connect, agência digital e filiada à JWT. Ele disse que tinha recebido uma indicação do seu amigo que havia previamente me entrevistado e gostaria de bater um papo comigo. A agência era menor, porém era parte de uma grande rede global e atendia alguns clientes grandes como Sprite, Kuat, UNICEF, Warner Bros entre outros. A vaga também era para estagiário de planejamento e fiquei super animado com a oportunidade. Quando perguntado sobre faculdade eu falei que começaria a cursar em Fevereiro de 2008. Estava só esperando sair o resultado do PROUNI, mas que já estava tudo certo para estudar na Mackenzie. A proposta para trabalhar na agência chegou no dia seguinte e eu, super feliz, aceitei!
- CORTA -
ESPM: Vermelho. Mackenzie: Vermelho. Anhembi: Vermelho. FAAP: Vermelho. PUC: Vermelho. Tudo vermelho. Queixo caído. Suando frio. Olhos arregalados. Lágrimas caindo. Minha nota não tinha sido o suficiente para entrar em nenhuma das faculdades que eu selecionei. E sem a possibilidade de uma segunda chance. Eu precisava começar na RMG em breve e já havia comunicado minha saída a Riot. Nem eu e nem meus pais tinham dinheiro para pagar uma mensalidade integral em nenhuma daquelas faculdades. Fiquei sem chão. O que eu faria?
Contei a situação para os meus pais e meu irmão e decidimos buscar soluções alternativas para o problema. Começamos uma busca por faculdades mais baratas. Fiz vestibular em algumas, mas ainda sim todas exigiam uma mensalidade que não seria capaz de ser coberta pelo meu salário ou dos meus pais, afinal meu pai ainda vinha de uma situação financeira complicada. A data para iniciar no novo trabalho estava chegando e eles estavam cobrando os papéis da faculdade. Foi um momento de desespero, onde achei que ficaria sem meu emprego atual que tinha sido uma benção em minha vida e sem a nova oportunidade que havia surgido.
- CORTA -
Meu pai me liga e fala: “Passando de carro na região da sua casa encontrei uma faculdade que está com processo seletivo aberto. E o melhor: a mensalidade é R$250,00 por mês.” Não pensamos duas vezes: fiz o vestibular e passei (acho que teria passado mesmo se tivesse colocado só o meu nome na folha). Como era de se esperar a faculdade era bem ruim. Minha sala não tinha nem 10 alunos, infraestrutura péssima, professores desqualificados e administração bem desorganizada. Apesar de tudo, essa foi a minha salvação. Mandei os documentos e comecei a trabalhar na RMG como estagiário de planejamento.
A minha primeira experiência com planejamento foi amor à primeira vista. Adorei participar de projetos onde fazia pesquisas para entender o mercado, concorrências, oportunidades e pensar em ideias junto com o time de criação. Mais para frente tive a oportunidade de ser o planejador da conta da Warner e participei de cabines para os filmes e junto com o time criativo, pirávamos em ideias de divulgação para filmes que iam de romance até terror.
Foto com o Gabriel e o Guilherme + Fotos do EBP 2008
Vale mencionar que nessa época, também participei de um projeto super legal em parceria com meus amigos Gabriel Maluf e Guilherme Cury, dois amigos blogueiros publicitários. Com a fomentação dos blogs que falavam sobre publicidade, reunímos informalmente um grupo de blogueiros publicitários (ou publicitários blogueiros?) que gostariam de se conhecer e se conectar pessoalmente. De um encontro informal surgiu a ideia de fazer algo maior e então criamos o EBP: Encontro dos Blogueiros Publicitários. Junto com o Gabriel e Guilherme, organizamos um evento para um público de mais ou menos 50 pessoas, e corremos atrás de parcerias, espaço, palestrantes e divulgação. Nessa época, o Gabriel trabalhava no departamento de planejamento da agência Africa, uma das maiores agências de publicidade do Brasil, na época com Nizan Guanaes como CEO. Gabriel me ligou e perguntou se eu estava interessado em substituí-lo, pois ele havia recebido uma proposta para outra agência. Eu estava há apenas alguns meses na RMG Connect e não sabia direito o que fazer. Foi aí que meu irmão me ensinou uma coisa que levo comigo até hoje: nunca negue um papo. Mesmo que não dê certo ou que não é o que você esperava, toda oportunidade de conhecer alguém novo e de se fazer conhecido é válida.
Mais uma vez, fiquei encantado com a infraestrutura da agência. A entrevista foi muito boa e a vaga era para trabalhar no centro de inteligência, uma área que fazia parte do departamento de planejamento da agência e era responsável por nutrir os planejadores com informações, pesquisas, análises e insights. Me encantei com a vaga e mais ainda com o salário: R$ 1.500 reais, mais do que o dobro do que eu ganhava como estagiário. Após muito refletir decidi aceitar o desafio e comecei a trabalhar na Africa no auge dos meus 18 anos. Esse foi um período onde mais me desenvolvi profissionalmente. Aprendi uma série de habilidades que carrego até hoje, melhorei muito meu inglês pois muitas das informações que precisávamos buscar eram de fontes internacionais, além de trabalhar com planejadores incríveis que atendiam várias indústrias diferentes (telecom, montadoras, banco, eletrodoméstico, jornal, etc). Foi inclusive nesse período onde o Itaú comprou o Unibanco e onde Obama ganhou as eleições presidenciais dos EUA. Lembro que tive a oportunidade de ajudar o time de planejamento munindo-os de informações sobre estratégias e comunicação de empresas que se fundiram além de fazer um dossiê Barack Obama, onde analisei todos os fatores de sucesso de uma das primeiras campanhas da história que utilizaram o poder do digital e das redes sociais.
Foto com o Pedro Scaramuzza e Pedro Bérgamo, colegas da Africa durante a confraternização de final de ano
Inclusive, essa época me fez lembrar de uma situação hilária que passei. Certo dia, um pouco antes do horário de almoço, uma das diretoras de planejamento me perguntou se eu não gostaria de substituí-la em um evento da indústria de telecomunicações que ela não poderia ir. Ela inclusive me encarregou de anotar os dados e outras informações interessantes que eles apresentariam lá. Aceitei de primeira e chamei o táxi para me levar (minha primeira vez pegando um táxi na vida). Lembro como se fosse hoje qual era a minha roupa: um tênis All Star preto meio sujo, calça jeans reta, camiseta verde musgo curta por cima, com uma camiseta manga comprida branca por baixo. Parecia um menino que acabara de sair da escola (e de certa forma era verdade). Como trabalhava no back-end, nunca tive que me preocupar com minha vestimenta para reuniões com clientes ou algo do tipo. O evento estava acontecendo em um hotel super chique em São Paulo. Entrei no hall e me dirigi ao restaurante onde estava tendo o almoço. Executivos para todos os lados, homens e mulheres bem vestidos e eu, um menino com All Star preto e camiseta. Almocei sozinho em uma mesa e lembro-me de dois funcionários do hotel que me perguntaram quem eu era e se eu precisava de alguma coisa. Falei que era da agência e tinha ido para o evento. Aparentemente eles aceitaram. O evento foi realizado em uma sala grande, com mesas e apresentações em Power Point. Anotei tudo e depois montei um relatório do que foi falado. Olhando para trás eu fico imaginando: o que os executivos do evento pensaram sobre mim? “Quem é esse menino? Será que ele é filho de alguém? Por que mandaram um estagiário para um evento de diretores?” Não sei o que eles realmente pensaram, mas só sei que fui, fiz meu papel e olhando para trás eu só rio dessa situação toda.
O trabalho na Africa estava indo maravilhosamente bem. Eu estava ganhando bem, o trabalho era legal, o time era maravilhoso e o VP de Planejamento é uma das pessoas mais incríveis que já conheci. Mas eu tinha acabado de fazer 19 anos e uma decisão que afetaria minha vida para sempre precisava ser feita. E no próximo post irei contar mais sobre ela.
Você deve estar se perguntando: mas e a faculdade? Pois é, larguei mão depois que entrei na Africa. E o que já era de se esperar, 2 anos depois a faculdade faliu completamente. Obrigado por me salvar e descanse em paz, faculdade…
Aprendi muitas coisas durante esses altos e baixos. E como tenho feito nos outros posts, aqui vai uma lista desses aprendizados:
Aprendi a nunca mentir, mesmo que a sua intenção possa ser boa e inocente. Minha atitude de afirmar que eu já estava matriculado em uma faculdade poderia ter me deixado desempregado e frustrado. Seja honesto com os outros e consigo mesmo, o tempo todo.
As coisas vão dar errado. Seja por um erro seu ou por algo que não está no seu controle. Aprendi que preciso buscar soluções em vez de ficar se lamentando ou culpando outras pessoas. Vá até o último segundo e seu esforço será recompensado.
Aceite desafios, mesmo que eles pareçam impossíveis. Mesmo que você não consiga, algo bom você vai tirar do fracasso ou do sucesso.
A importância da pesquisa e da informação. Errei ao acreditar em algo que tinha ouvido de parentes meus. Aprenda a buscar informações e conhecimento. Utilize essas informações ao tomar decisões e arriscar.
Nunca negue um papo. Repetindo o que disse anteriormente: Mesmo que não dê certo ou que não seja o que você esperava, toda oportunidade de conhecer alguém novo e de se fazer conhecido é válida.
Agradecimento especial a pessoas que foram importantes nessa fase: Gabriel Maluf, Guilherme Cury, Jean Boechat, Patrice Lamiral, Rafael Paes, Gus Borrmann, João Canal, Pedro Cruz e toda a equipe de planejamento da Africa.
Neste último capítulo da série sobre minha trajetória profissional, saiba como fui parar no Google, como foi mudança para a Califórnia e os desafios de lidar com o Inglês.